CHUVA DE ONTEM- 3mm.
LITERATURA
Retirantes (Graciliano Ramos)
A vida na fazenda se tornara difícil. Sinhá vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a caatinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre.
Mas quando a fazenda se despovoou, viu que tudo estava perdido, combinou a viagem com a mulher, matou o bezerro morrinhento que possuíam, salgou a carne, largou-se com a família, sem se despedir do amo...
Saíram de madrugada. Sinhá Vitória meteu o braço pelo buraco da parede e fechou a porta da frente com a taramela. Atravessaram o pátio, deixaram na escuridão o chiqueiro e o curral, vazios, de porteiras abertas, o carro de boi que apodrecia, os juazeiros. Ao passar junto às pedras onde os meninos atiravam cobras mortas, Sinhá Vitória lembrou-se da cachorra Baleia, chorou, mas estava invisível e ninguém percebeu o choro.
Desceram a ladeira, atravessaram o rio seco, tomaram rumo para o sul. Com a fresca da madrugada, andaram bastante, em silêncio, quatro sombras no caminho estreito coberto de seixos miúdos... Caminharam bem três léguas antes que a barra do nascente aparecesse. (Trecho de "Vidas Secas", Graciliano Ramos)
CENÁRIO DE SECA - "Vidas Secas" pinta um quadro repetido nas grandes secas: ou partia para um lugar onde tinha onde pelo menos comer, ou padeceria muito mais com a fome e a precisão de todo tamanho.
Copiar - O autor utiliza a palavra "copiar" com um significado pouco conhecido da população: varanda.
Baleia - "Baleia" é grafada com inicial maiúscula. Afinal, nome de animal é nome próprio.
Caminharam bem três léguas antes que a barra do nascente aparecesse - Era desse jeitinho que os antigos faziam para poder se deslocar para lugares distantes e muitas vezes sem rumo.
Manoel de Etelvina - Quarta-feira, 16, mais uma pessoa da minha época se foi. Há tempos que não o via. Era filho de Dona Etelvina, que nos faz lembrar gelé (geleia, no dicionário de português).
HUMOR
O vizinho corre até a cerca de arame que separa as duas propriedades e grita para o dono da casa ao lado:
- Ô João! O seu cachorro está levando uma galinha do meu quintal. Faça o favor de chamá-lo!
E João, muito tranquilo, responde:
- Por que você não chama a sua galinha? (Folhinha 2007)
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