PANDORGAS (Augusto Meyer)
De outras vezes, íamos ao morro especialmente para soltar pandorga. Meu pai participava do brinquedo. Ninguém punha mais paciência, carinho e arte em armar uma pandorga, uma pandorga-mãe, com roncador e rabo grosso. A festa começava cedo, na manhã de domingo, com a rebordosa dos preparativos. Rápido e firme, cortava as rijas folhas de papel, recortava a capricho a estrela central de cinco pontas e as quatro estrelinhas que iam coladas aos quatro cantos, encarnadas sobre o fundo amarelo ou verde. Feita a armação de varetas leves de taquara, cuidadosamente amarradas de modo a embarrigar-se um pouco, vinha o revestimento de papel cobrir aquele esqueleto - e de repente, surgia a pandorga ainda rabona como uma coisa viva, querendo empinar-se logo aos ventos do morro, furar o teto da casa, virar cambotas malucas por cima das nossas cabeças.
Pronta, enfim, tomávamos o caminho aberto no barranco fronteiro com degraus de barro endurecido e, chegando ao alto, começávamos a soltar o pandorgão ao vento, dando linha como um pescador, até vê-lo diminuir na altura azul; do centro da sua pequenina estrela vermelha partia um fino fio quase invisível, que vinha parar nas minhas mãos, transformado em grosso barbante.
A arraia voadora dava puxões bruscos à linha, sem mais nem menos desandava a rabear, cabeceava e estremecia toda, ao empinar-se. Tinha a nítida impressão de sair aos trambolhões, arrastado pelos ares, se não me firmasse bem sobre as pernas. Era preciso dar mais linha ou recolhê-la com muito cuidado. Mas aquietava-se logo depois , como se compreendesse que tudo aquilo não passava de um brinquedo.
Pandorgas de todas as cores e tamanhos mexiam-se para um lado e outro, presas a um fio, bichos fantásticos de papel que os donos traziam a uma cura de ar livre. Subiam para o azul os gritos da criançada. O vento da tarde embebedava de tão vivo, e ao fim de algum tempo, meu irmão e eu, que nos revezávamos na manobra, tontos da emoção violenta e da vertigem que nos dava a atenção voltada para o alto sem descanso, passávamos a linha ao nosso pai, tão empenhado no brinquedo como nós mesmos. (Do livro Segredos da Infância)
OUTROS SINÔNIMOS DE PANDORGA: Papagaio, pipa, tapioca, arraia, estrela. Os dois primeiros são conhecidos entre nós. Pandorga é conhecido no Sul do Brasil. Estrela é em Portugal.
BRINQUEDO DA NOSSA INFÂNCIA - Apesar de muitos meninos brincarem de pipa - chamávamos papagaio - foi uma brincadeira que eu preferia ficar olhando os outros. Havia papagaios grandes e agressivos. Ou eram os donos que eram agressivos? Sei que muitos papagaios eram temidos, pois eles derrubavam os outros. Muitas vezes eles enganchavam nos fios de energia. Algumas vezes provocavam a quebra dos fios, pois uns batiam no outro e chegava a faltar energia no bairro.
A PIPA NA MÚSICA - O grupo "Boca livre" em "Quem tem a viola" poetiza a pipa nos seguintes termos: quem tem a viola faz o coração vazio voar vadio como uma pipa no ar:
Quem tem a viola
Pra se acompanhar
Não vive sozinho
Nem pode penar
Tem tom de roupa
Quando seca no varal
Luz do Sol
Quando cai no cristal
Faz o luar brilhar
E um coração vazio
Voa vadio
Feito uma pipa no ar
O EXAME DE ADMISSÃO - O Exame de Admissão era uma espécie de vestibular para o aluno entrar na quinta série. Português, Matemática ou Aritmética, Geografia e História eram as matérias do exame.
O livro tinha mais de 500 páginas e abrangia as matérias exigidas no exame: Português (Prof. Domingos Paschoal Cegalla); Geografia (Prof. Aroldo de Azevedo); História (Prof. Joaquim Silva) e Matemática (Prof. Osvaldo Sangiorgi).
O exame era uma seleção dos melhores alunos. Não podemos condenar a prática, já que temos os vestibulares, os enems e concursos. Afinal, não há vagas para todo mundo.
Durou mais de trinta anos.
Quem quiser ver ou rever a capa do livro, poderá acessar o site www.anosdourados.blog.br/2019/03/imagens-escola-livro-para-curso-de.html.
VARIANTE - De nome de automóvel a algo relacionado a uma doença. Foi o que comentou um senhor bem antigo: "Ora, antigamente havia um carro chamado variante e agora apareceu uma tal de variante..."
A Variant, grafada sem a letra e, é um carro da linha Volkvagen, sucesso nos anos 70.
PREVISÃO DE UM PROFETA DA CHUVA - Hoje vai chover. Sinal: Pela manhã apareceu torriame no Norte.
HUMOR - O camarada vai trabalhar em uma obra como ajudante de pedreiro. Logo no primeiro dia, o mestre de obras chama a sua atenção;
- Ô Vicente, os outros levam dez tijolos de cada vez! Por que você leva só cinco?
- Ah, como tem gente folgada neste mundo, chefe! Acho que eles têm é preguiça de fazer duas viagens. (Seleção de Seleções)
Nenhum comentário:
Postar um comentário