sexta-feira, 26 de março de 2021

VOOS LONGOS

Olha como a nossa mente pode voar para distâncias longas, curtas ou médias. Até com as palavras podemos realizar voos. Não faz nem dez anos que voo tinha sobre o seu primeiro o (ó) um acento denominado circunflexo, chapéu, cangalha ou cangaia (ô). O acento foi suprimido por causa do acordo ortográfico entre os países que têm a língua portuguesa como oficial.

Outros voos a nossa memória pode realizar relembrando de episódios bons da vida. É preferível estes aos maus, afinal, recordar é viver, diz o dito popular.

Foi o que fez o poeta Casimiro de Abreu em Meus oito anos:

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!

Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!

Como são belos os dias
Do despontar da existência!
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;

O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino d'amor!

Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!

Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!

Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus
— Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!

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