domingo, 24 de outubro de 2021

ENTRETENDO - EDIÇÃO DE DOMINGO

Virose - Chegou a vez dela. Está chegando devagarinho, sem pressa, mas inquietante.

Escondido - Sol escondido em parte. Dia abafado e poucos galhos das árvores em movimento. Resumo dessa manhã de domingo.

Velhos tempos 

A canção interpretada por Bartô Galeno foi sucesso entre fins dos anos 70 e 80. É uma das músicas bregas do passado de boa qualidade e que explorava o romantismo das pessoas de forma extraordinária.

Velhos tempos que não voltam
Nunca mais, nunca mais
Por onde andará teu sorriso
Naquela eclosão a se desmanchar

Em tua boca
Queria ouvir novamente
Aquelas palavras, ditas por ti

Te amo meu bem
Não sei por onde andará
Mas ouvindo este canto
De mim lembrarás

Então procure sonhar
E num sonho verás
Que eu te amo de mais

Por mais que a vida me arraste
E me ponha em desgaste
Não esqueço de ti

Mesmo secando o meu pranto
No meu desencanto não esqueço de ti
Velhos tempos a gente não esquece
Quando acontece o que me aconteceu.

O sino de ouro (Júlia Lopes de Almeida)

Maria Matilde tinha um sonho: fazer construir rente à baía de São Marcos, na sua linda cidade de São Luís do Maranhão, uma torre alta, muito alta, encimada por um enorme sino de ouro com os nomes de todos os Estados do Brasil, formados com pedras preciosas. Quando o sino badalasse, reboariam na atmosfera as suas sonoridades, acompanhadas pelo ritmo das ondas, e, quando os astros o iluminassem, rutilaria no espaço esplendidamente. 

Mas a velha louca parecia não ter um vintém de seu. Morava num casebre em ruínas, vestia-se de trapos imundos, comia só raízes e ervas do mato e bebia água na concha da mão encarquilhada e ossuda. Não tinha dinheiro para as necessidades da vida, porque, se lhe davam uma esmola, ela corria a escondê-la para o sino de ouro, e ia iludir a fome com os sobejos atirados pela caridade, ou um rabo de peixe chupado à porta de um pescador. Ninguém o sabia, mas o seu colchão estava já tão cheio de moedas que lhe magoava o corpo miserável, a ponto dela preferir estender-se no chão duro, sobre uma esteira esgarçada. 

Tinha a sua ideia fixa, e, para realizá-la, seria precisa uma fortuna! A sua torre de ouro, com um sino cravejado de pedras preciosas, maravilharia o mundo inteiro... Em casa ou na rua, a visionária falava só, gesticulando, movendo no ar os dedos nodosos, de unhas grandes. 

As crianças fugiam atropeladamente ao ver-lhe, de longe, o busto esguio; os adultos afastavam-se daquela imundície, e ela passava sem ver ninguém, resmungando: — Quando o sino de ouro fizer: ba-ba-la-ão! ba-ba-la-ão! todo mundo dirá: “É o coração do Brasil que está batendo... Que lindo é e como bate bem!” E ela ria-se, sacudindo os longos braços magros, a repetir pelas ruas sossegadas: — O coração do Brasil está parado... quero fazê-lo palpitar com força... Ba-ba-la-ão! Dão! dão! 

Uma noite de chuva e de relâmpagos, Maria Matilde chegou encharcada e tremendo com o frio da febre à sua choça; mas, logo ao entrar, esbarrou com uma pobre rapariga da vizinhança, que se ajoelhou chorando a seus pés. 

Qual não foi o seu espanto! se ninguém a procurava nunca... Uns tinham medo da sua morada de louca, supunham-na outros feiticeira, bruxa, o diabo em pessoa! 

Ela parou no umbral, estarrecida; a outra exclamou de mãos postas: 

— Maria Matilde, tem dó de mim! Minha madrasta, aquele má mulher, expulsou-me de casa e aos meus irmãozinhos, que foram mendigar por essas ruas quase nus... É por eles que eu choro. Dá-me um filtro, Maria Matilde, para abrandar o coração de minha madrasta e fazer com que meu pai abra a sua porta aos filhos pequeninos, que são inocentes e estão passando fome, sofrendo frio, com medo do escuro, por essas praias. Se for preciso o meu sangue para salvar os anjinhos, toma-o! Abre-me as veias, aqui tens o meu corpo! 

E a moça desnudava-se oferecendo os pulsos e o colo suplicemente. 

Maria Matilde, de olhos arregalados, dobrou-se toda sobre a linda cabeça da moça: 

— Darás a vida por teus irmãos? 

— Darei a vida! 

— Jura?

 — Juro! Aqui me tens, mata-me, se para bem deles a minha morte for precisa. Dizem que és feiticeira, mas o que tu és é surda! Não prolongues a agonia de meus irmãos, Maria Matilde! Aqui me tens! 

A velha considerou a rapariga com espanto. depois, rapidamente, correu ao catre, sumiu as mãos trigueiras nos rasgões da enxerga e atirou punhados de moedas, vertiginosamente, para o regaço da moça estupefata. 

— Teus irmãos estão nus? Toma, vai comprar agasalho para eles! Têm fome? Dá-lhes pão...muito pão... Toma! Toma! Toma! Vai para junto deles, boa irmã, vai com Deus! 

A moça aparava aquelas moedas inesperadas num delírio de felicidade. A velha deu-lhe tudo, tudo. depois empurrou-a violentamente pela porta fora, fechou-se por dentro e desatou a chorar. 

Como haveria ela agora de comprar o sino de ouro e construir a sua alta torre rutilante? Teria de recomeçar pelo primeiro vintém, e as costas doíam-lhe tanto...tanto! Ao menos nessa noite poderia dormir sobre o seu colchão... O que a fazia tremer eram aquelas cobrinhas de gelo que andavam a passear pela sua espinha... A cabeça estalava-lhe. 

Era a febre! Maria Matilde debateu-se toda a santa noite, com os lábios secos, os olhos em fogo, as roupas, ainda alagadas da chuva, unidas aos membros doloridos. 

Pela madrugada serenou. e rompia a manhã gloriosa, quando ela ouviu a voz dulcíssima de um anjo dizer-lhe à cabeceira: 

— Construíste esta noite a tua torre e por ela subirás ao céu! 

Maria Matilde atirou para fora do catre as pernas finas, aconchegou aos rins os molambos da saia, aos ombros os farrapos de um xale e correu ansiosa para a praia. 

A cidade dormia ainda; só os passarinhos despertavam cantando. No largo mar azul o sol nascente espelhava uma coluna de ouro tão larga e tão longa que ninguém lhe poderia calcular as dimensões. 

No ar voavam gaivotas até além, às nuvens de ametistas e de rubis, que engrinaldavam no horizonte a torre deslumbrante. Era a pedraria do sino que reluzia! Sumindo nela os olhos felizes e fascinados, Maria Matilde sacudiu os longos braços, gritando vitoriosa, antes de cair redondamente na areia fria:

— Ba-ba-la-ão! ba-ba-la-ão! Dão... Da...ão! Quando a miragem do sol se desfez, já a louca tinha subido pela torre de ouro até o céu! 

HUMOR - Menino sabido

- Filhinho, essa é a laranjeira que dá laranjas. Aquele é um pessegueiro e dá pêssegos. Veja a macieira de onde colhemos maçãs. De qual árvore você gosta mais?
- Gosto mais da árvore de Natal porque ela dá presente. 
(Da Folhinha do Coração de Jesus, 2007)

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PROVÉRBIO

A parvos, aborrecem-lhes discretos.